Texto de Mariana Correia Pinto • 22/09/2011 in, PUBLICO
Hugo Araújo não sabe o que é ter um emprego, no sentido clássico do termo. A vida dele são muitos projectos ao mesmo tempo – é trabalhador independente, patrão dele mesmo, "freelancer". Está num grupo que já representa um quarto da força da economia portuguesa. E que tende a crescer.
Começou a viagem pelo mercado de trabalho ainda no ensino secundário. Um trabalho aqui, outro ali - e uma rede que começou a compor-se. Fez um curso técnico de multimédia, especializou-se em animação 3D, formou-se em Novas Tecnologias da Comunicação da Universidade de Aveiro. Tem 22 anos.
As clássicas oito horas de trabalho nunca fizeram sentido para Hugo Araújo: "O das nove às cinco não existe" para um "freelancer", que enfrenta um modelo de emprego "mais trabalhoso": "São sete dias por semana".
Nova Revolução Industrial
Vítor Ferreira, investigador do Instituto de Ciências Sociais (ICS), em Lisboa, dá uma achega à dimensão do fenómeno: “O 'freelancer' vai ser a Revolução Industrial dos nossos tempos", afirma. "Está a tornar-se cada vez mais importante."
"Gosto de fazer as coisas à minha maneira e no meu 'timing'", diz Hugo Araújo para justificar a opção pelo trabalho independente. É verdade que chegou a tentar a fórmula tradicional dos currículos, mas rapidamente desistiu: "Quando olho para trás nem percebo porque o fiz, não serve de nada”.
Este é o "tempo de arriscar" - agora que está em casa dos pais e uma falha de dinheiro no fim do mês ainda não compromete. Hugo Araújo fala disto para introduzir um dos grandes problemas com que os "freelancers" lidam: "Nunca se sabe com quanto dinheiro se chega ao fim do mês". Até mesmo o conceito de "fim do mês" deixou de fazer sentido.
Ter projectos, e não carreira
Há uma palavra que se repete no discurso do jovem de 22 anos: "Projectos". É um espelho da análise de Vítor Ferreira: "A relação com o tempo profissional passa a ser sobretudo pensada a prazo, em termos de projecto".
É uma alteração do conceito de carreira, que significa "um caminho sem volta e uma alteração estrutural", afirma o investigador do ICS. "As sociabilidades são, hoje em dia, muito dispersas" – e isso altera a forma como as pessoas se relacionam.
Hugo Araújo admite que sim: que a solidão do trabalho de "freelancer" pode ser complicada. Por isso paga uma mensalidade num espaço de "coworking": "Há mais gente, podemos ir falando, tirando dúvidas", explica.
A ideia por detrás do "freelancer" é o de ser dono da própria vida. Imposição dos tempos com que Hugo Araújo vive bem: no fundo, é como se tivesse constituído a própria empresa – "Não existe ainda formalmente pelos custos que isso implica".
Não há empresa, mas criou-se uma marca. A Apicula – assim se chama o projecto global – trabalha em "webdesign" e design ecológico. No início do próximo ano talvez Hugo Araújo deixe de se apelidar formalmente de "freelancer". Mas o espírito será sempre esse.
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